Tribunal reconhece o direito de sociedade de contadores de recolher o ISS com base no número de profissionais aplicando o tema Nº 918 fixado pelo STF

São Paulo, SP 29/10/2019 –

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em julgamento inédito realizado pela 1ª Câmara, reconheceu para uma sociedade que presta serviços de contabilidade e de auditoria o direito de pagar o Imposto sobre Serviços (ISS) calculado pelo número de profissionais e não sobre o faturamento conforme exigia o Município de Porto Alegre, aplicando, para tanto, o entendimento do Supremo Tribunal Federal com Repercussão Geral exarado para a sociedade de advogados.   

No mês de abril, o Plenário do Supremo Tribunal Federal julgou o Recurso Extraordinário nº 940.769/RS para declarar a inconstitucionalidade da legislação municipal de Porto Alegre e fixou o Tema 918: “É inconstitucional lei municipal que estabelece impeditivos à submissão das sociedades profissionais de advogados ao regime da tributação fixa em bases anuais na forma estabelecida por lei complementar nacional.”

Isso porque o artigo 9º, §3º do Decreto-Lei nº 406/68, recepcionado como Lei Complementar pela Constituição Federal de 1988, adotando um critério objetivo, elegeu determinadas profissões regulamentadas, dentre elas, médicos, enfermeiros, veterinários, contadores, auditores, dentistas, economistas e outras, para que sejam tributadas pelo regime diferenciado do ISS.

Para fazer jus ao recolhimento do ISS calculado pelo número de profissionais e não sobre um percentual do faturamento, a referida norma federal prevê apenas que os sócios estejam registrados nas respectivas entidades de classe e assumam a responsabilidade técnica pelo serviço prestado.

Os Municípios, com nítido propósito arrecadatório, comumente restringem a tributação diferenciada por meio de legislações que preveem diversos e absurdos requisitos a serem preenchidos pelo contribuinte como condição para conceder o enquadramento de sociedade uniprofissional.

Em razão disso, a Ordem dos Advogados do Brasil (Seccional do Rio Grande do Sul) impetrou Mandado de Segurança Coletivo no qual o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade da referida legislação por extrapolar os limites do Decreto-Lei nº 406/68 ao dispor de modo divergente sobre base de cálculo de tributo, em violação ao artigo 146, III, “a” da Constituição Federal e na mesma oportunidade fixou o Tema nº 918.

Evidentemente que o referido Tema nº 918 não se restringe às sociedades de advogados, pois caso assim fosse, estaria sendo dado tratamento anti-isonômico em desfavor das demais sociedades de profissão regulamentada que se encontram exatamente na mesma situação.

Acolhendo esses argumentos da sociedade de auditoria e contabilidade, o Desembargador Irineu Mariani do Tribunal Rio Grande do Sul (Apelação nº 0077218-36.2019.8.21.7000) deu ganho de causa à contribuinte. A respeito do julgamento do STF, o Desembargador mencionou que “não há dúvida que se aplica a toda e qualquer sociedade de profissionais, uma vez que o princípio é exatamente o mesmo. No caso, temos uma sociedade que presta serviços de auditoria e de contabilidade, portanto, assim como em relação à de advogados, a tributação de ISS deve ocorrer por profissional habilitado.”.

Apesar da obviedade da aplicação do Tema nº 918 fixado pelo Supremo Tribunal Federal para todas as profissões regulamentadas eleitas pelo artigo 9º, §3º do Decreto-Lei nº 406/68, já se constata certa resistência dos órgãos fracionários em aplicá-lo, tanto que o próprio resultado do julgamento que deu provimento à apelação da contribuinte foi por maioria, sendo três votos a favor e dois votos contra.

Mais uma razão para que o referido acórdão mereça ser exaltado, uma vez que prestigiou o quanto restou decidido pelo Supremo Tribunal Federal determinando o seu real alcance ao assegurar a mesma tributação para situações absolutamente idênticas e garantindo a sistemática da Repercussão Geral que teve por finalidade justamente aglutinar o julgamento de demandas repetitivas com o mesmo tema e enfoque constitucional.

Além disso, o Desembargador Relator Irineu Mariani, incansável estudioso do Direito Societário e autor de livros e artigos jurídicos a respeito, dá uma verdadeira lição ao distinguir a sociedade empresária da sociedade simples unicamente em razão de seu objeto social, ou seja, de sua atividade-fim, esclarecendo, portanto, que a lucratividade e a forma social ou modelo adotado pela sociedade não podem ser critérios para distingui-las.

O acórdão frisa que o legislador adotou critério objetivo ao eleger quais sociedades de prestação de serviços fazem jus à tributação diferenciada, isto é, “se consta na lista do §3º, o legislador entendeu que prepondera o caráter pessoal; logo, descabe ao intérprete dizer, caso a caso, com base no seu subjetivismo infinito, quando prepondera o caráter pessoal (atendimento pessoal) e quando o empresarial (atendimento não pessoal).

Restou reconhecido, ainda, que para a tributação especial do ISS são apenas dois os elementos decisivos: o objeto social deve contemplar um dos serviços eleitos no artigo 9º,§3º do Decreto-Lei nº 406/68 e a responsabilidade pessoal por eventual erro também deve ser do profissional habilitado que o prestou, com todas as implicâncias, inclusive éticas perante o respectivo órgão de classe.

Em recente julgamento, a 3ª Câmara de Direito Público do E. Tribunal de Justiça do Ceará no processo nº 0006818-45.2008.8.06.0001 também reconheceu o direito de outra sociedade de contadores e auditores de fazer jus ao regime do ISS fixo, oportunidade em que ressaltou que, a teor do que dispõe o parágrafo único do artigo 966 do Código Civil, a sociedade que presta serviços de natureza intelectual não pode ser considerada empresária.

Os recentes acórdãos renovam as esperanças de que haja, daqui em diante, uma releitura do ISS devido pelas sociedades de profissão regulamentada e a mudança da jurisprudência pretérita que, infelizmente e equivocadamente, se apega a elementos injurídicos e irrelevantes para negar aplicação desejada pelo vigente Decreto-Lei nº 406/68 para os poucos serviços por ele eleitos. 

Autores: 

Luciana Nini Manente – Advogada Tributarista | Escritório Eduardo Jardim Advogados Associados.

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José Eduardo Burti Jardim –  Advogado Tributário | Escritório Eduardo Jardim Advogados Associados.

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