Brasil gera deflação e se diferencia do mundo

No mês de agosto, constatou-se que o pior momento da inflação no Brasil passou e, além da deflação em combustíveis e alimentos, começou-se a ver uma incipiente melhora qualitativa no IPCA, com o recuo dos bens industriais. A inflação de serviços continua pressionada, mas esse é um grupo com elevado caráter inercial e que tende a reagir mais lentamente às condições financeiras.

Nesse ambiente, acredita-se que o início do corte de juros pode ser antecipado em relação à precificação do mercado. Um ponto de atenção são as sucessivas surpresas positivas do mercado de trabalho, que tem se mostrado mais resiliente que o esperado. Todavia, o economista Felipe Bernardi Capistrano Diniz acredita que estas sejam reflexo da reabertura da economia ainda em curso, que tende a se esgotar em algum momento, e da dimensão ainda tímida dos efeitos defasados da política monetária. Em relação ao real, a moeda brasileira deve continuar se beneficiando do juro real elevado nos próximos trimestres. Além disso, considera-se excessivos os prêmios de risco da moeda relacionados às incertezas fiscais e eleitorais. Os indicadores fiscais não param de surpreender positivamente, dando alguma folga para a acomodação de certas demandas sociais.

Se os Bancos Centrais emergentes elevaram substancialmente os juros a partir de meados de 2021, os BCs desenvolvidos ainda estão pressionados pela alta da inflação, tentando controlar seus juros. Vários BCs mudaram o discurso e muitos já admitem que o preço a se pagar virá na forma de recessões e perda de empregos. Dito isso, a questão mais relevante para os mercados continuará a ser até onde as condições financeiras precisarão ser apertadas.

Nos mercados internacionais, o mês foi marcado por uma reversão do otimismo de julho e os ativos de risco voltaram a sentir o aperto das condições financeiras por parte dos BCs. A Europa continua em uma situação delicada. Diz Felipe Bernardi Diniz, “o mercado de energia continua fortemente pressionado pela falta de gás advindo da Rússia e isso tem elevado a inflação.” No final do mês, especulações sobre a reunião de setembro do ECB, Banco Central Europeu, e uma potencial alta de 75 bps, aumentaram o estresse dos mercados. Além disso, o presidente do FED, Jerome Powell, subiu o tom contra a inflação em seu discurso na conferência de Jackson Hole, Wyoming. O claro combate por parte dos BCs em relação à inflação tem pressionado as taxas de juros e afetado os mercados acionários. Além disso, o dólar segue em sua tendência de alta global, algo típico de momentos de aversão a risco.

Nos Estados Unidos, o aperto das condições financeiras sugere continuidade na piora do setor imobiliário. Ainda que a atividade demonstre arrefecimento, em particular no mercado de bens, a economia tem se mostrado mais resiliente. “Indicadores apontam que o mercado de trabalho ainda está apertado e, com isso, continuamos preocupados com a dinâmica salarial nos EUA e seus impactos sobre a persistência da inflação de serviços. Nos parece improvável que um juro terminal de 3,5% seja suficiente, sozinho, para produzir uma desaceleração econômica forte o bastante para trazer os núcleos de inflação para perto da meta em 2023”, destaca Felipe Bernardi Diniz.

Na China, os dados mais recentes apontam para uma desaceleração da economia e para a possível necessidade de mais suporte fiscal. Como é sabido, é mais complexo estimular a economia num ambiente de piora da confiança sobre o setor imobiliário. A política Covid-Zero e novos problemas de oferta energética local têm limitado uma recuperação mais plena da atividade.

No Brasil, adicionalmente a esse cenário externo, se soma a queda dos impostos sobre combustíveis e energia, que já produziu uma forte deflação em julho e deve produzir outra em agosto. As estimativas do Focus para o IPCA de 2022 cederam de 8% para 6,7% nos últimos dois meses e devem continuar nessa trajetória. Felipe Diniz acredita que isso dará conforto para que o BC encerre o ciclo de alta da Selic em 13,75%.

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