Humanizar o atendimento médico é muito mais do que reformar hospitais e distrair pacientes

São Paulo, SP 7/10/2019 – A culpa não é do jovem médico que experimenta o fracasso quando comprova que sua ciência cura menos do que ele esperava, mas do processo de formação.

Na opinião do fundador da Sobramfa Educação Médica & Humanismo, Pablo González Blasco, quando se fala em Medicina Humanista, o principal é despertar a empatia adormecida dentro de cada profissional, aquela mesma que, durante os anos de estudo, foi guardada numa gaveta em nome do tal distanciamento profissional.

Recentemente, médicos da Sobramfa – Educação Médica & Humanismo foram convidados a dar uma série de palestras e workshops em universidades italianas. O “Giro Umanistico” teve como objetivo sensibilizar médicos e demais profissionais da saúde sobre a importância de se conectarem mais com pacientes. Falar em humanização da saúde vem se tornando cada vez mais recorrente no mundo todo. Mas o que significa de fato a Medicina Humanista? Na opinião de Pablo González Blasco, diretor-fundador da Sobramfa, ainda há muita desinformação sobre o tema, não por parte da sociedade, mas principalmente por médicos, estudantes de medicina e tantos outros profissionais do setor de saúde.

“Não se trata de mudar a iluminação dos hospitais nem de pintar as paredes de verde ou azul para aumentar o conforto visual. Isoladamente, também não se trata de trazer palhaços, personagens do universo infantil, leitores voluntários ou ainda animais de pequeno porte para que o paciente internado possa se esquecer pelo menos por alguns minutos do dia o calvário de sua doença. Tampouco se deve pensar que humanizar a saúde se restringe a diminuir as filas de atendimento e recorrer a programas de prevenção de doenças. Obviamente, tudo isso tem grande importância dentro do contexto em que estão inseridos milhares de pacientes. Mas o principal, quando se fala em Medicina Humanista, é despertar a empatia adormecida dentro de cada profissional, aquela mesma que, durante os anos de estudo, foi guardada numa gaveta em nome do tal distanciamento profissional”, diz Blasco.

Durante um workshop promovido por um dos principais institutos de cardiologia de São Paulo, que integra uma lista pequena de hospitais de ensino, uma médica bastante competente e engajada revelou o quanto se sentiu desamparada e despreparada quando, ainda no quinto ano da faculdade de medicina, perdeu seu primeiro paciente. “Fui para casa chorar. A gente se dedica tanto aos estudos para ingressar na faculdade e mais ainda depois, durante nossa formação de médicos. Mas em nenhum momento somos devidamente preparados para os fracassos do dia a dia. Pior ainda, somos orientados constantemente a manter um distanciamento de segurança, a não demonstrar nossas emoções nem deixar que elas venham à tona em público. Naquela época, eu e outros estudantes montamos um grupo de discussões filosóficas para nos apoiarmos uns nos outros. Só assim conseguimos superar a morte dos nossos pacientes, depois de termos tentado de tudo para mantê-los vivos”. Na opinião de Blasco, esse tipo de médico – que reconhece suas limitações e fraquezas, mas que nem por isso foge à sua responsabilidade – é quem busca transformar o ambiente em que trabalha num convívio mais colaborativo e em sintonia com seus pacientes.

“É notório o progresso técnico da medicina. Não há como negar que ela está curando muito mais do que antes. Mas as pessoas continuam morrendo, já que esse é o destino do ser humano. Sendo assim, a culpa não é do jovem médico que experimenta o fracasso quando comprova que a sua ciência cura menos do que ele esperava, mas do processo de formação que está equivocado”, afirma o diretor da Sobramfa. “O que se pode esperar quando a ordem recomendada para a atuação do médico é curar, aliviar e, em último caso, confortar? O lógico é pensar que estou avançando do mais importante para o menos importante, para o detalhe. Quando não consigo curar, tenho que aliviar. E quando nem aliviar consigo, resta‐me confortar. Proceder nessa sequência fatalmente apresenta o alívio e o conforto como um prêmio de consolação. Mas há aí um terrível engano. Enquanto confortar é algo que deve ser feito sempre, pela altíssima prevalência, o curar apresenta uma prevalência muito menor. Seria lógico, então, que o processo da atuação médica contemplasse essa proporção para produzir melhores médicos”.

Segundo Blasco, a ordem dos fatores altera o produto. A ênfase, o tempo que se dedica nos anos de formação, respeitando as proporções ‘epidemiológicas’, faz toda a diferença. “Um médico que não sabe confortar nem aliviar não deveria ter diploma de médico nem atuar profissionalmente. Mas o que a avaliação formal quer medir é tão somente o conhecimento que, em determinadas e limitadas circunstâncias, lhe permitiriam curar alguns pacientes. E nem isso avalia corretamente, já que da teoria até a prática há uma distância enorme. Hoje, o estudante de medicina entra na faculdade sabendo o que é cuidar. Com o tempo, se esquece dos pacientes por estar muito ocupado com ‘a medicina´. É fundamental revisar todo esse processo. Nos estágios oferecidos pela Sobramfa, os alunos acompanham médicos experientes em todas as visitas aos pacientes, aprendendo na prática o que é desenvolver empatia, o que significa prestar o melhor atendimento possível ao paciente e à sua família, respeitando suas crenças, opiniões, limitações e vontades”.

Vale dizer, também, que o percurso que a medicina tem seguido nestes últimos anos, enfatizando a técnica e negligenciando o humanismo, acarreta novos problemas que, além de prejudicar o paciente — que sempre leva a pior —, também causa transtornos ao médico. “Todo o tema do erro médico encontra aqui a sua explicação mais profunda. A medicina não é uma ciência exata. Tem falhas que só podem ser reparadas com amor e dedicação. Quando não se entende isto, quando um médico apresenta a medicina como uma ciência exata, deverá pagar também as consequências do insucesso. Quando o médico se apresenta como um mecânico de pessoas, deverá aceitar a punição se não fizer os cálculos certos para ‘consertar o estrago’. Quando o paciente percebe que o médico carece da dimensão humana, pedirá satisfações e cobrará uma reparação se o profissional não conseguir cumprir suas promessas. Já a atenção e o carinho, quando verdadeiros, estabelecem outra dimensão de relacionamento entre médico e paciente. O doente sabe que pode contar com seu médico e que, ainda que o prognóstico não seja bom, este irá permanecer a seu lado, fazendo o seu melhor, até o fim”, conclui Blasco.

Fonte: Prof. Dr. Pablo González Blasco, diretor-fundador da SOBRAMFA Educação Médica & Humanismo – www.sobramfa.com.br

Website: http://https://sobramfa.com.br/estagio-para-estudantes-de-medicina/

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